sexta-feira, 11 de outubro de 2013

“Quando encontramos comida no lixo é motivo de festa”, relata sertanejo que sofre com a seca

“Quando encontramos comida no lixo é motivo de festa”. O relato, segundo o padre Djacy – conhecido ativista que denuncia nas redes sociais as consequências da prolongada estiagem no estado da Paraíba – é do chefe de uma família da comunidade na cidade de 

Boa Ventura, no Sertão da Paraíba, a 422 quilômetros da capital João Pessoa. A família migrou da zona rural para as periferias da cidade, não encontra emprego e sobrevive catando lixo.  

O padre, que há quase dois meses, está fazendo peregrinação solitária por várias cidades do Vale do Piancó paraibano, contou que já presenciou essas e outras situações dramáticas vivenciadas pela população por conta da falta de água para consumo humano. Segundo os sertanejos, além do sofrimento com a falta de água para beber, eles também não têm o que comer. 

Segundo a Agência Executiva de Gestão de Águas do Estado da Paraíba (Aesa), em 121 reservatórios que ela monitora, apenas três estão sangrando. São 22 reservatórios em situação crítica (com menos de 5% do seu volume total) e 33 em observação (com menos de 20% de sua capacidade). Outros 65 estão com capacidade armazenada superior a 20% do seu volume total.  

Padre Djacy narrou que o caso mais chocante foi da família de Boa Ventura que trabalha catando lixo. “Estive em uma comunidade urbana na cidade que as pessoas só comem o que encontram no lixão. Eles me disseram que não tem do que se alimentar. Então, quando encontram resto de comida levam para casa”, disse. 

Nas redes sociais, o padre posta fotos e relatos para a série que ele intitulou 'Nos Caminhos da Sede'. Na peregrinação, ele visita diversas comunidades e conversa com as pessoas sobre os problemas que elas estão passando.
O padre afirmou que se deparou também com a miséria na qual famílias rurais estão vivendo. Segundo ele, muitos moradores das cidades de Pedra Branca, Igaracy, Piancó, Boa Ventura, Diamante e Santana de Mangueira (municípios da região do Vale do Piancó) , vivem da agricultura de subsistência, mas com a falta de chuvas, tudo plantado pelo produtores, foi perdido por completo.
“Toda semana eu vou às comunidades rurais do Vale do Piancó e a cada dia que passa aumenta o drama do povo no que diz respeito à falta de água. Além da ausência do líquido, há falta de alimento para as famílias. Muitas pessoas me falam que a situação é crítica na alimentação. Nesses locais, a agricultura é de subsistência, com a plantação, por exemplo, de arroz e milho, mas esse semestre a colheita foi zero. Eu registrei a colheita morrendo”, relatou.

Segundo o padre Djacy o auxílio do programa federal Bolsa Família não é suficiente para resolver os problemas que as famílias estão sofrendo. “O programa ameniza um pouco, mas no Sertão as casa tem até 10 pessoas, então 200, 300 reais não consegue atender a todos. Além do Bolsa Família há a necessidade que o governo envie cestas básicas para essas localidades”, pediu.

Para o padre, a única esperança dos sertanejos é a transposição das Águas do Rio São Francisco. “Eu entro nas casas, converso, fotografo e escuto os clamores deles. O que eu vejo é muita pobreza, muito sofrimento. Eu sou uma testemunha ocular. É preciso agilidade na transposição para resolver o problema da seca no Nordeste”.
Diretores e técnicos da Aesa estão percorrendo esta semana seis municípios do Vale do Piancó para explicar a situação dos açudes e as alternativas para a manutenção do abastecimento durante esse período.
Na cidade de Curral Velho o açude Bruscas, que comporta 38 milhões de metros cúbicos de água, está com 43% de sua capacidade. Em Itaporanga, o açude Cachoeira dos Alves, pode armazenar 10 milhões de metros cúbicos, mas hoje tem apenas 30% deste valor. 
Naira Di Lorenzo/OlhoD'águaOnline